Ao acordar recebo uma carta virtual de uma irmã com esse poema de Clarice Lispector, com a intenção de acalentar meu coração da dor de uma perda; coração partido:
Faz de conta
Faz de conta que ela era uma princesa azul pelo crepúsculo que viria,
faz de conta que a infância era hoje e prateada de brinquedos,
faz de conta que uma veia não se abrira e
faz de conta que sangue escarlate não estava em silêncio branco escorrendo e que ela não estivesse pálida de morte, estava pálida de morte mas isso fazia de conta que estava mesmo de verdade, precisava no meio do faz-de-conta falar a verdade de pedra opaca para que contrastasse com o faz-de-conta verde cintilante de olhos que vêem,
faz de conta que ela amava e era amada,
faz de conta que não precisava morrer de saudade,
faz de conta que estava deitada na palma transparente da mão de Deus,
faz de conta que vivia e que não estivesse morrendo pois viver afinal não passava de se aproximar cada vez mais da morte,
faz de conta que ela não ficava de braços caídos quando os fios de ouro que fiava se embaraçavam e ela não sabia desfazer o fino fio frio,
faz de conta que era sábia bastante para desfazer os nós de marinheiros que lhe atavam os pulsos,
faz de conta que tinha um cesto de pérolas só para olhar a cor da lua,
faz de conta que ela fechasse os olhos e os seres amados surgissem quando abrisse os olhos úmidos da gratidão mais límpida,
faz de conta que tudo o que tinha não era de faz-de-conta,
faz de conta que se descontraíra o peito e a luz dourada a guiava pela floresta de açudes e tranqüilidade,
faz de conta que ela não era lunar,
faz de conta que ela não estava chorando.
C.L.
Ao lê-lo fiquei emocionada e vibrante, então respondi com sentimentos escritos:
Eu fiz de conta que fazia de conta...
Por isso foi real...
E vivi...
Certa que fui eu mesma...
Afetei e deixei-me afetar, toquei e deixei-me tocar...
Certa que ser no e com o outro é possível a dor, além da alegria e felicidade do prazer de amar...
Mas na presença das "fratelas", o ouvido apurado no que me diziam: que eu posso, que eu mereço e que nem sempre o pecado está em mim!
Agora sinto dor e deixo rolar lágrimas, pela saudade do antes e a possibilidade do que poderia ser o depois...
Certa que fui eu mesma...
E vivi...
Obrigada minha amiga!
"que eu posso, que eu mereço e que nem sempre o pecado está em mim!"
ResponderExcluirBem assim, moça. Ser o que se pode ser, sem pensar em pecados. Sem pensar que é pecado.
Bjos Bjos